domingo, 13 de maio de 2012

ADVOCACIA DO IMPOSSÍVEL



Advogar, para quem o faz com ética, competência e seriedade (pasmem! existem profissionais deste escol) tem se tornado um ofício cada vez mais árduo e decepcionante. Assistimos, desolados e indignados, a um judiciário, que ‘deveria ser’ o guardião de nossas salvaguardas essenciais ao Estado Democrático de Direito (cristalinamente definido em nossa Carta Maior), transformando-se em  mera máquina ratificadora dos interesses dominantes, impedindo a real consecução da justiça.
Em simples termos, a consecução da justiça implica, entre outros basilares princípios, no  acesso à Ordem Jurídica Justa, no Duplo Grau de Jurisdição, no Devido Processo Legal,  na Instrumentalidade do Processo, na Segurança Jurídica.
Rogata maxima venia, nossos ‘magistrados’ (e aqui é apenas uma mera generalização já que tive o prazer de conhecer vários com capacidade digna de seu ofício de jus dicere), nestes últimos dez anos, apenas se investiram de uma função de agentes ratificadores da prevalência dos grandes capitais e interesses dominantes a espezinhar, vilipendiar e excutir os consumidores (inclusive de suas moradas que, diga-se, é Direito Constitucional expressamente garantido). Pobres mutuários consumidores, açoitados renitentemente em suas justas pretensões.
Em verdade, tem ocorrido que as instâncias superiores “parecem” ter adotado uma nova postura, impedindo que legítimos recursos, devidamente preparados, preenchendo os ‘n’ requisitos intrínsecos e extrínsecos exigidos pela engessada Lei Processual, sendo, insidiosamente, ‘assassinados’ sem que sequer possam dar seus primeiros respiros nas mais altas cortes. Mal adentram os frios mármores e granitos onde habitam as autoridades judiciárias, são atingidos violentamente por despachos denegatórios ou acórdãos que são dados com uma brevidade nunca vista.
De nada adianta, comprovarmos por A + B (e dizem que o direito não é ciência exata mas argumentação) que, e.g., o Sistema Price aplicado aos contratos “de prestações diferidas no tempo impõe excessiva onerosidade aos mutuários devedores do sfh, pois no sistema em que a mencionada tabela é aplicada, os juros crescem em progressão geométrica, sendo que, quanto maior a quantidade de parcelas a serem pagas, maior será a quantidade de vezes que os juros se multiplicam por si mesmos, tornando o contrato, quando não impossível de se adimplir, pelo menos abusivo em relação ao mutuário, que vê sua dívida se estender indefinidamente e o valor do imóvel exorbitar até transfigurar-se inacessível e incompatível ontologicamente com os fins sociais do sistema financeiro da habitação.(fonte: https://ww2.stj.gov.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200401239720&dt_publicacao=13/06/2005)
Por Deus, o próprio Richard Price em seu livro ‘Observations on Reversionary Payments’, edições de 1783 e 1803, desenvolveu suas geniais Tabelas de Juros Compostos. Trabalho desenvolvido com o escopo criar um sistema de pagamento para seguro de vida e aposentadorias, elaborado a pedido de sociedade seguradora, tendo Price construído tabelas que denominou de ‘Tables of Compound Interest’ (Tabelas de Juro Composto). Há de ser gizado que apenas em nosso país as Tables of Compound Interest  são conhecidas como Tabela Price, em referência ao autor das mesmas, como forma de escamotear a crueldade deste sistema para o consumidor mutuário.
Escreveu o próprio Price:
Um centavo de libra, emprestado a um juro composto de 5% na data do nascimento do nosso salvador teria, neste período, “ou seja, em 1773 anos” produzido mais dinheiro do que o que poderia caber em 150 milhões de globos terrestres, cada um equivalente a Terra em magnitude e todos de ouro maciço. Porém caso ele tivesse sido emprestado a juros simples ele teria no mesmo período, totalizado não mais  do que sete xelins e seis centavos. Todo governo que aliena fundos destinados a reembolso, opta pelo cultivo de dinheiro do segundo modo ao invés do primeiro” (Tradução referente ao trecho da pg 228 do livro Observations on Revisonary Paymentes” da de autoria de Richard Price, Quarta Edição, Volume I, publicado em Londres, por t. Cecil, em 1783).
JOSÉ JORGE MESCHIATTI NOGUEIRA, em seu livro ‘Tabela Price – Da Prova Documental e Precisa Elucidação do seu Anatocismo’, Ed. Servanda, Campinas, 2002, assim consignou:
Para demonstração da ilegalidade ou não da Tabela Price, faz-se a seguir um comparativo entre o cálculo de juros simples ou lineares e o cálculo dos juros pela já referida Tabela Price. Primeiro se faz um comparativo com exemplos simplificados entre cálculos de 06 e de 12 meses de prazo (Situações ‘A’ e ‘B’ adiante).
Situação A: Juros de 10% ao mês e prazo de 06 meses:
Cálculo de juros simples ou lineares: 10% x 6 meses = 60% de juros totais em 6 meses. Cálculo pelo Sistema Price (1+ 10%)6 = (1,10)6 = 1,7715 – 1 = 0,7715 x 100 = 77,15% de juros totais nos mesmos 06 meses.

Conclusão: pelo Sistema Price não se está pagando 10% ao mês, mas sim, na verdade, 12,85% ao mês, o que ocorre em face de a aludida Tabela já conter em sua sistemática de cálculo uma função exponencial que constitui uma progressão geométrica e gera na verdade a incidência de juros sobre juros.

Situação B: Juros de 10% ao mês e 12 meses de prazo:
Cálculo de juros simples ou lineares: 10% x 12 meses = 120% de juros totais em 12 meses.
Cálculo pelo Sistema Price: (1 + 10%)12= (1,10)12 = 3,1384 – 1 = 2,1384 x 100 = 213,84% de juros totais em 12 meses.

Conclusão: pelo Sistema Price não se está pagando 10% ao mês, mas sim, na verdade, 17,82% ao mês, fato, como já referido na letra ‘A’, decorrente da função exponencial contida na fórmula da Tabela Price.
Note-se que os juros de 10% ao mês, aplicados pela Tabela Price, na realidade, são mais altos, e quanto maior o prazo, maior é a diferença entre a Tabela Price e os juros simples: 10% em 6 meses, a juros simples ou lineares, correspondem a 60%, enquanto que, pela Tabela Price, ascendem a 77,15% (uma diferença a maior de 17,15%).
Estendendo-se o prazo para 12 meses, tem-se 120% a juros simples ou lineares e 213,84% pelo Sistema Price (uma diferença a maior de 93,84%). Essa situação mostra que, na verdade, o que é relevante não é propriamente a taxa de juros contratada (10%), mas sim o prazo, pois, quanto maior o prazo, maior será a quantidade de vezes que os juros se multiplicarão por eles mesmos {(10%)6.(10%)12}, o que demonstra e configura o anatocismo como traço inerente e imanente à Tabela Price.
Indago: De que nos adianta debruçarmo-nos, dias e dias, na elaboração de perfeitos recursos de apelação, recursos especiais,  recursos extraordinários, agravos regimentais e de instrumentos, exaustivamente comprovando todos os aspectos legitimamente combatidos e aqui, trouxemos a baila, a título de exemplificação, o Sistema de Amortização Francês (Tabela Price) que inconcussamente envolve capitalização de juros, verdadeiro anatocismo, prática vedada pelo  Dec. nº 22.626/33, art. 4º, Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal, Súmula 93 do STJ, observando que a posterior súmula 596 do mesmo STF apenas diz respeito ao limite dos juros e não à forma do seu cálculo. De que nos adianta, se sequer permitem que nossas ‘peças’ dêem breves suspiros?
Paralelamente há uma outra realidade dentro do judiciário. Aquele judiciário moroso, onde vencedores (consumidores) em primeiras instâncias, aguardam há mais de sete longos anos por algum desfecho, mas, neste continente, aquela mesma pena que ‘assassina’ com a maior das brevidades e boa precisão é deixada parada ‘inocentemente’ sobre portentosas mesas, nada se manifestando ao longo de longos anos.
Vemos lides de cunho alimentar aguardando, na maior das morosidades, por um julgamento de um simples apelo, enquanto litígios envolvendo instituições financeiras, grandes construtoras, poderios (o próprio Estado e União são exemplos) rapidamente fulminados (diga-se: o consumidor, o simples cidadão  fulminados).
Confesso, bastante difícil continuar a exercer o munus publico nesta conjuntura. Usando um ditado popular: ficar incessantemente dando murros em pontas de afiadas facas, não há mão que suporte, por mais determinação que se tenha. Melhor vender sanduíche e suco naturais na praia ao invés de estragar  a nossa saúde por conta de tantos e inaceitáveis desmandos.

M. 

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